Notícias do Sinpol-MS

Juventude Dilacerada

Semana Online

Um cheiro de perfume. Foi o suficiente para que a vida da estudante Luana Vieira Gregório, de 15 anos, fosse ceifada em Campo Grande (MS), no último dia 11. A banalidade do crime assusta. Luana foi esfaqueada no abdômen, na saída da Escola Estadual José Ferreira Barbosa, por uma colega de sala, de 16 anos, que se sentiu irritada com seu perfume (veja o vídeo acima). A jovem Luana deixa uma filha, que um dia depois de sua morte completou um ano de idade. 


Tragédias como esta estão se tornando comuns, Brasil afora. A violência contra (e entre) jovens e adolescentes é como uma epidemia que se alastra no tecido social e nos deixa boquiabertos diante da brutalidade e da desvalorização da vida humana.

O Centro-Oeste é a região brasileira com o maior índice de homicídios de jovens e adolescentes, com 69,8% das pessoas nessa faixa etária mortas desta forma. A informação é parte do Mapa da Violência 2013: Homicídio e Juventude no Brasil, publicado pelo Centro de Estudos Latino-Americanos (Cebela), com dados do Subsistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde.

Segundo o levantamento, a violência contra os jovens brasileiros aumentou exponencialmente nas últimas três décadas. Entre 1980 e 2011, as mortes não naturais e violentas nesta faixa etária – como acidentes, homicídios ou suicídios – cresceram 207,9%. Se forem considerados só os homicídios, o aumento chega a 326,1%. Do total de 46.920 mortes entre pessoas com idade variando de 14 a 25 anos, em 2011, 63,4% tiveram causas violentas. Na década de 1980, o percentual era 30,2%.

Estes números são ratificados pela pesquisa Global Burden of Disease (GBD) – Carga Global de Doença, em português - publicada em fevereiro pela revista inglesa The Lancet e organizada pela Universidade de Harvard, dos Estados Unidos, o Imperial College, de Londres, e a Organização Mundial da Saúde (OMS). O fator violência é apontado neste levantamento como a principal causa de mortes entre jovens no Brasil e Paraguai. Entre os países da América Latina, Argentina, Chile e Uruguai têm os assassinatos em 12ª colocação, enquanto na Europa Ocidental, que inclui países como Inglaterra, França e Espanha, as mortes violentas entre jovens ficam em 50ª lugar.


De acordo com o Índice de Homicídios na Adolescência (IHA), criado em 2007 pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência (LAV-Uerj), o número de mortes entre jovens de 12 a 18 anos vem aumentando paulatinamente ao longo do tempo. Para cada mil pessoas nesta faixa etária, 2,98 são assassinadas. O índice em 2009 era de 2,61. As previsões são preocupantes: até 2016 um total de 36.735 adolescentes poderão ser vítimas de homicídio no Brasil.


Causas do massacre

Segundo o Mapa da Violência 2013, o aumento da violência entre jovens e adolescentes demonstra a omissão da sociedade e do Poder Público em relação aos jovens, especialmente os que moram nos chamados polos de concentração de mortes, no interior de estados mais desenvolvidos; em zonas periféricas, de fronteira e de turismo predatório; em áreas com domínio territorial de quadrilhas, milícias ou de tráfico de drogas; e no arco do desmatamento na Amazônia que envolve os estados do Acre, Amazonas, de Rondônia, Mato Grosso, do Pará, Tocantins e Maranhão.

De acordo com o estudo, a partir “do esquecimento e da omissão passa-se, de forma fácil, à condenação” o que representa “só um pequeno passo para a repressão e punição”.

Doriam Borges, do LAV-Uerj e um dos responsáveis pelo levantamento do IHA, explica que o índice de homicídios entre os jovens expressa a metamorfose que a violência vem sofrendo ao longo do tempo. “Nas décadas de 1960 e 1970, a violência era caracterizada por assalto a bancos e, embora houvesse homicídio e latrocínio, o número era menor. Atualmente, o tráfico de drogas nacional e internacional foi ganhando força no país, mas o que é mais relevante é o aumento do tráfico de armas e a facilidade de acesso a estes instrumentos”.

Para Cristiana Cordeiro, juíza do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o problema passa também por uma crise de autoridade. “Vivemos uma era em que os papeis parentais estão muito fluidos. Há uma ausência de responsáveis. O artigo 227 da Constituição faz uma gradação de responsabilidades na educação de jovens e adolescentes na qual a família, a sociedade e estado devem assumir esta responsabilidade. O que observamos, no entanto, é um grande número de jovens sendo criados pela vida. Não há quem assuma o papel diretivo”, afirma.

O Procurador da República, Guilherme Schelb, aponta a violência como reprodutora de conflitos, mas alerta para a necessidade de punição. “Em sua grande maioria, os jovens autores de crimes violentos como homicídios e estupros foram vítimas de abusos. A relação entre uma criança que foi vitima de abuso sexual, físico ou de forte negligência com um adolescente ou adulto que se torna violento é direta. Todavia, esta situação de privação de direitos e negligencia não pode justificar ou dar direito a este jovem de praticar o mal”, alerta.


Geografia da violência

O autor do Mapa da Violência 2013, Julio Jacobo Waiselfisz, explica que a transição da década de 1980 para a de 1990 causou mudanças no modelo de crescimento nacional, com uma descentralização econômica que não foi acompanhada pelo aparato estatal, especialmente o de segurança pública. O deslocamento dos interesses econômicos das grandes cidades para outros centros gerou a interiorização e a periferização da violência, áreas não preparadas para lidar com os problemas.


“O malandro não é otário, não vai atacar um banco bem protegido, no centro da cidade. Ele vai onde a segurança está atrasada e deficiente, gerando um novo desenho da violência. Não foi uma migração meramente física, mas de estruturas”, destacou Waiselfisz.


Nos estados e capitais em que eram registrados os índices mais altos de homicídios, como em São Paulo e no Rio de Janeiro, houve redução significativa de casos, devido aos investimentos na área. São Paulo, atualmente, é a capital com a maior queda nos índices de homicídios de jovens nos últimos 15 anos (-86,3%). A Região Sudeste é a que tem o menor percentual de morte de jovens por causas não naturais e violentas (57%).


Em contraponto, Natal (RN), considerado um novo polo de violência, é a capital que registrou o maior crescimento de homicídios de pessoas entre 15 e 24 anos – 267,3%. A região com os piores índices é a Centro-Oeste, com 69,8% das pessoas nessa faixa etária mortas por homicídio.


Fonte:Semana Online


volta ao topo