Lei Anticorrupção é a prova de que o crime não compensa
Ao ver o Brasil na 72ª posição do ranking de corrupção de 2013 da organização Transparência Internacional, atrás de países como Cuba, Costa Rica, Porto Rico, Chile e Uruguai, confesso que senti um grande incômodo. A posição brasileira mostra o longo caminho a ser percorrido.
Com a Lei Anticorrupção, que entrou em vigor no fim de janeiro, o Brasil dá um importante passo no combate à corrupção. Buscar um ambiente de negócios saudável é fundamental para o desenvolvimento do mercado e para a atração de novos investimentos. O maior fluxo de investimentos e de negócios, por sua vez, cataliza o desenvolvimento do país.
O combate à corrupção não é novo no Brasil, basta ver algumas convenções no plano internacional que foram firmadas neste sentido. São elas a Convenção Interamericana contra a Corrupção, de 1996, incorporada à legislação pátria através do Decreto 4.410/02; a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, de 1997, incorporada pelo Decreto 3.678/00; e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, de 2003, incorporada através do Decreto 5.687/06.
Embora houvessem esses compromissos, foi com esta Lei Anticorrupção — Lei 12.846/13 — que nos deparamos com uma importante inovação capaz de alterar a forma das empresas lidarem com esse problema – a responsabilidade objetiva das organizações.
A responsabilidade objetiva traz um desafio: o cuidado das empresas em suas relações com a administração pública. A partir de agora, caso um funcionário cometa um ato de corrupção, ainda que sem autorização da empresa, esta será responsabilizada pela infração, com a obrigação de reparar o dano, além de sujeitar-se a pesadas multas e a outras sanções previstas na lei.
Na esfera administrativa, a aplicação da multa pode variar de 0,1% a 20% do faturamento bruto da empresa. Na esfera judicial, os bens e direitos obtidos por atos de corrupção serão confiscados, a atividade da empresa pode ser suspensa ou parcialmente interditada. Ela poderá, ainda, perder os subsídios, incentivos e empréstimos de instituições públicas ou controladas pelo poder público, como o BNDES, além de sujeitar-se a uma das mais severas penas previstas — a dissolução compulsória da sociedade, conhecida como a “pena de morte” da empresa.
Aquelas organizações punidas serão também inscritas em um Cadastro Nacional de Empresas Punidas — o Cnep, que informará o nome da empresa, assim como as penas aplicadas.
Para os mais descrentes em relação à lei, aqueles que acreditam que a prescrição de cinco anos deixará muitas empresas impunes, uma má notícia. Esse prazo só começa a contar a partir do momento em que a autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário conheça a infração. Ou seja, se isso ocorrer daqui a dez anos, será a partir desta data que se contará a prescrição.
Como diz o ditado popular, ao bom entendedor, meia palavra basta. As empresas que quiserem reduzir seus riscos e aprimorar seu ambiente de negócios devem implementar programas de compliance que contem com o apoio da alta administração, que possuam códigos de ética e de conduta bem elaborados, de fácil entendimento para todos os envolvidos, com treinamentos regulares a seus funcionários, com um canal de denúncias e com a identificação das áreas que mais oferecem risco. Se ainda assim ocorrer uma infração, a existência do programa poderá servir como atenuante da pena administrativa.
Por fim, há também a possibilidade de se firmar um acordo de leniência, no qual a pessoa jurídica se compromete a colaborar na investigação da infração, identificando outros envolvidos e auxiliando com informações e documentos para a apuração dos fatos. Sujeito a certos requisitos, o acordo pode representar uma redução de até 2/3 da multa aplicável.
A despeito do seu texto deixar alguns pontos em aberto, como os critérios da dosimetria da pena e, em alguns momentos, não possuir uma redação mais técnica, esta lei exercerá um importante papel na mudança da cultura corporativa, estimulando às empresas a buscarem uma nova postura no relacionamento com a administração pública, uma postura preventiva e autofiscalizadora, reduzindo riscos e contribuindo para um ambiente de negócios mais ético e confiável. Afinal, esta lei deixou claro para as empresas que o crime não compensa.
Plínio Shiguematsu é doutorando na Faculdade de Direito da USP, advogado do Felsberg Advogados e membro do Instituto de Direito Societário Aplicado
Com a Lei Anticorrupção, que entrou em vigor no fim de janeiro, o Brasil dá um importante passo no combate à corrupção. Buscar um ambiente de negócios saudável é fundamental para o desenvolvimento do mercado e para a atração de novos investimentos. O maior fluxo de investimentos e de negócios, por sua vez, cataliza o desenvolvimento do país.
O combate à corrupção não é novo no Brasil, basta ver algumas convenções no plano internacional que foram firmadas neste sentido. São elas a Convenção Interamericana contra a Corrupção, de 1996, incorporada à legislação pátria através do Decreto 4.410/02; a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, de 1997, incorporada pelo Decreto 3.678/00; e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, de 2003, incorporada através do Decreto 5.687/06.
Embora houvessem esses compromissos, foi com esta Lei Anticorrupção — Lei 12.846/13 — que nos deparamos com uma importante inovação capaz de alterar a forma das empresas lidarem com esse problema – a responsabilidade objetiva das organizações.
A responsabilidade objetiva traz um desafio: o cuidado das empresas em suas relações com a administração pública. A partir de agora, caso um funcionário cometa um ato de corrupção, ainda que sem autorização da empresa, esta será responsabilizada pela infração, com a obrigação de reparar o dano, além de sujeitar-se a pesadas multas e a outras sanções previstas na lei.
Na esfera administrativa, a aplicação da multa pode variar de 0,1% a 20% do faturamento bruto da empresa. Na esfera judicial, os bens e direitos obtidos por atos de corrupção serão confiscados, a atividade da empresa pode ser suspensa ou parcialmente interditada. Ela poderá, ainda, perder os subsídios, incentivos e empréstimos de instituições públicas ou controladas pelo poder público, como o BNDES, além de sujeitar-se a uma das mais severas penas previstas — a dissolução compulsória da sociedade, conhecida como a “pena de morte” da empresa.
Aquelas organizações punidas serão também inscritas em um Cadastro Nacional de Empresas Punidas — o Cnep, que informará o nome da empresa, assim como as penas aplicadas.
Para os mais descrentes em relação à lei, aqueles que acreditam que a prescrição de cinco anos deixará muitas empresas impunes, uma má notícia. Esse prazo só começa a contar a partir do momento em que a autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário conheça a infração. Ou seja, se isso ocorrer daqui a dez anos, será a partir desta data que se contará a prescrição.
Como diz o ditado popular, ao bom entendedor, meia palavra basta. As empresas que quiserem reduzir seus riscos e aprimorar seu ambiente de negócios devem implementar programas de compliance que contem com o apoio da alta administração, que possuam códigos de ética e de conduta bem elaborados, de fácil entendimento para todos os envolvidos, com treinamentos regulares a seus funcionários, com um canal de denúncias e com a identificação das áreas que mais oferecem risco. Se ainda assim ocorrer uma infração, a existência do programa poderá servir como atenuante da pena administrativa.
Por fim, há também a possibilidade de se firmar um acordo de leniência, no qual a pessoa jurídica se compromete a colaborar na investigação da infração, identificando outros envolvidos e auxiliando com informações e documentos para a apuração dos fatos. Sujeito a certos requisitos, o acordo pode representar uma redução de até 2/3 da multa aplicável.
A despeito do seu texto deixar alguns pontos em aberto, como os critérios da dosimetria da pena e, em alguns momentos, não possuir uma redação mais técnica, esta lei exercerá um importante papel na mudança da cultura corporativa, estimulando às empresas a buscarem uma nova postura no relacionamento com a administração pública, uma postura preventiva e autofiscalizadora, reduzindo riscos e contribuindo para um ambiente de negócios mais ético e confiável. Afinal, esta lei deixou claro para as empresas que o crime não compensa.
Plínio Shiguematsu é doutorando na Faculdade de Direito da USP, advogado do Felsberg Advogados e membro do Instituto de Direito Societário Aplicado