Entrevista do presidente do Sinpol ao jornal O Estado
O Estado – Quais avanços o Sinpol sentiu em relação às reivindicações feitas na atual gestão do sindicato?
Alexandre Barbosa da Silva – Fizemos um levantamento geral das delegacias do Estado. Ficamos quatro anos controlando isso. Em algumas,conseguimos reformas paliativas. Por exemplo, a de Itaquiraí, que estava caindo aos pedaços, com frestas nas paredes. Reivindicamos ao governo e conseguimos, no final de 2013, uma reforma no prédio. Chegamos um dia lá e a fossa estava estourada, cheirando mal. E a delegacia é como um queijo suíço, rodeada por fossas. À medida que vai enchendo uma, constroem outra. Essa é uma situação de precariedade comum em pelo menos 70% das delegacias do Estado. Houve algumas reformas, mas poucas e paliativas. Em Campo Grande, uma das reivindicações é o prédio do Cepol, que não tem condições de atender ao público. Já fizemos manifestações e até um bolo de aniversário sobre elas. O governo disse que irá construir um prédio próprio para as especializadas, mas não dá um prazo para que isso aconteça.
O Estado – Qual a sugestão para resolver este problema?
Barbosa – Propusemos que o Cepol e as especializadas se mudem para o antigo prédio do Fórum, na avenida Fernando Corrêa da Costa. É um lugar central e que atenderia bem ao público, inclusive abrigando delegacias sobre as quais o Estado paga aluguel.
O Estado – O Sinpol também cobra o aumento do efetivo. Por quê?
Barbosa – Hoje, de acordo com relatório que fizemos em todo o Estado, faltam no mínimo mil policiais civis. O governo abriu concurso para 220 vagas de investigadores e escrivães, mas é muito pouco para suprir a demanda. Por ano, aposentam-se em média de 30 a 40 policiais, fora os que pedem exoneração porque passaram em outros concursos, já que nosso salário é baixo. Estamos em 18º lugar no ranking dos salários. Com muita pressão, o governo abriu esse concurso, mas com vagas insuficientes.
O Estado – Outro levantamento mostra o ranking de resolutividade de crimes. Ele é inversamente proporcional à realidade que vocês relatam...
Barbosa – Em relação a homicídios, estamos em sexto lugar no país em resolução dos casos. Em todas as áreas estamos entre as dez melhores. Nossa Polícia Civil é uma das mais eficientes do país, segundo dados do Ministério da Justiça. Pedimos esse reconhecimento ao governo, já que desempenhamos nosso papel com estrutura defasada e salário precário. Os policiais trabalham porque gostam do que fazem. Só precisam ser incentivados.
O Estado – Como o sindicato vê o número de pedidos de afastamento de policiais por problemas psicológicos?
Barbosa – Quando ficamos sabendo que há um policial em licença psicológica, uma assistente social do sindicato vai até a casa dele e tenta conversar, para tentarmos encaminhá-lo ao Estado, que é o responsável. O que acarreta essa situação, principalmente? A sobrecarga de trabalho. O recurso material, que não tem. E os presos nas delegacias, que também causam estresse ao policial. A investigação e a perseguição do dia a dia a bandidos nas ruas são outros fatores. Não tem ninguém que consiga ficar são dessa forma. Reivindicamos ao governo do Estado a criação de um centro de atendimento psicológico, já que existe um grande número de policiais com esse tipo de licença. Existe o Ceapoc (Coordenadoria de Atendimento Psicossocial da Polícia Civil), mas que também trabalha precariamente. Nossa legislação, inclusive, prevê que, se o delegado percebe algum problema no policial, que o encaminhe para receber o tratamento e acompanhamento necessários.
O Estado – Isso poderia evitar situações de risco?
Barbosa – Se tivesse um acompanhamento poderia ser feita uma prevenção. Nossa vida profissional é difícil e estressante, e alguns policiais acabam tendo dificuldade no seu meio familiar. Com relação a essa questão ainda, quem faz a gestão quer, geralmente, punir. Não vemos preocupação em resolver o problema e tratar esse policial, recuperá-lo e trazê-lo de volta ao serviço. Quando ele tira licença, querem verificar se ele realmente está com problemas, contestar o laudo médico, tirar a arma do policial. Se ele passar 30 dias de licença, querem cortar as férias. Com essa política punitiva, a pessoa, mesmo doente, evita tirar licença. Você já trabalha com estrutura precária, deficit de pessoal, lidando com bandidos e criminosos, sai para trabalhar sem saber se volta para casa... a tensão acompanha o dia do policial. A política tem de ser de recuperar, não punir.
O Estado – Como o sindicato lida com os bicos?
Barbosa – Por que o policial faz bico? Porque os baixos salários levam a isso. Se você quiser uma qualidade de vida melhor, um sustento mais digno para sua família, precisa fazer bico para complementar a renda. E muitas vezes, depois de passar 24 horas no serviço, em vez de passar um tempo de lazer com a família, é obrigado a complementar a renda. E nossa família cobra também nossa atenção. Por isso, estamos reivindicando fortemente nos últimos anos que o governo ofereça um salário condizente com a profissão. Servimos e protegemos a sociedade. Só precisamos de uma valorização e reconhecimento, já que nossa dedicação é praticamente exclusiva.
O Estado – E em relação às investigações?
Barbosa – Hoje há um decreto dizendo que vai reduzir em 20% tudo nas delegacias. Como você vai investigar se não tem combustível para o carro? Como investigar se não temos uma viatura descaracterizada? Não temos. A maioria das viaturas está baixada,estragada, sem previsão de conserto. Munições são contadas. Não vou nem dizer a quantidade para não deixar o policial exposto. Há casos de policiais que trabalham com sua própria arma, e quando estraga não tem arma para repor e ele se vê obrigado a trabalhar com um revólver “38” antigo. Sem falar no desvio de função, que são as delegacias superlotadas. Vejo o Judiciário interditando presídios. Lá, estão eles com um sistema de recuperação. O agente penitenciário fez academia para recuperar o preso. O policial é preparado na academia para investigar, mas o policial está ficando preso na delegacia para custodiar presos. O Estado está tapando o sol com a peneira. Vai à imprensa e divulga contratações, entrega de viaturas. Mas a realidade é outra. Não adianta colocar a sujeira embaixo do tapete, porque o sindicato está aqui para levantar o tapete e assoprar a sujeira, para que a sociedade saiba realmente a condição e perseguição diária que acontece conosco.
PERFIL
Nome: Alexandre Barbosa da Silva
Naturalidade: Bela Vista (MS)
Formação: Ciências Contábeis, hoje é investigador da Polícia
Civil de Mato Grosso do Sul.
Ocupação atual: presidente do Sinpol-MS com mandato entre 2012 e 2015.
Fonte:Jornal O Estado - Edição 03/02/2014