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A matança da ordem

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 Por Olivardo Pires de Araújo Júnior


Desestruturar a ordem estabelecida, usando como ferramenta a matança de policiais, é o novo objetivo das facções criminosas atuantes neste país, e, embora as autoridades, do altar do seu olimpo, onde se julgam deuses, não possam visualizar a realidade terrena, em razão de uma percepção distorcida pelas nuvens da soberba e das vaidades pessoais, natural obstáculo entre aqueles que vivem nas alturas do poder, e os que pisam o solo da realidade, poder este distribuído entre os apadrinhados, por arranjos políticos de última hora, em detrimento do mérito pessoal, tal configuração de coisas é a causa do aumento do desespero dos meros mortais.


Neste cenário, a suposta superioridade cognitiva das ditas autoridades, digo suposta, haja vista, ser a sabedoria, um subproduto da vivência dos fenômenos intencionais, ou seja, só a obtém os que a experimentam na prática, e no setor de segurança pública não é diferente, no entanto, os homens da linha de frente nunca foram ouvidos, o que só aumenta o fosso entre o olimpo e a terra.


Agora, estes homens são mortos todos os dias pelos criminosos, cientes da falta de gestão séria dos assuntos de segurança pública por quem a comanda neste país. Neste raciocínio, é sabido de há muito tempo, que os criminosos estavam se estruturando para enfrentar os poderes constituídos desta nação, todavia, aqueles sérios e compromissados com a segurança da sociedade, ao alertarem as demais autoridades sobre esta estruturação, ainda incipiente no passado, entretanto, já com tentáculos em todos os presídios, eram desacreditados, ridicularizados, acusados de alarmistas e propagadores do caos. Contudo, o tempo passou e eles se mostraram certos de seus receios, concretizados agora no submundo do crime, e, perante a sociedade como PCC ou 1533, organização criminosa, capaz, pela segunda vez, de colocar o aparato estatal de segurança da maior cidade do país em situação de perplexidade, perante tamanha ousadia e coordenação, daqueles que estão segregados dentro de nossos presídios, a priori, isolados socialmente e incapazes de criarem problemas para a coletividade. No entanto, o quadro de expectação demonstrado, reflete exatamente o contrário, com um policial morto a cada 32 horas no Brasil.


O trágico neste filme, por hora projetado nas telas da sociedade é a morte justamente dos que cumpriram o seu dever e prenderam os que afrontavam a ordem constituída, defendendo desta forma a lei e a estabilidade social, deixando para o aparato estatal de segurança, a tarefa de apenas manter presos os delinquentes e ressocializá-los, como querem alguns filósofos, sociólogos e psicólogos, defensores de teses humanistas mirabolantes, que caem por terra o tempo todo, pela total incapacidade não somente da máquina estatal de aplicá-las a bom termo, contudo, também pela irrealidade dessas teorias frente à violência crescente da maioria dos marginais. Além do mais, é bom lembrar que a quase totalidade desses teóricos defendem suas ideias dentro de condomínios fechados e de luxo, distantes da realidade assombrosa das ruas e presídios de nosso país, onde o pesado fardo de conviver com leis utópicas socialmente recai sobre os cidadãos nas ruas, e sobre os homens de frente da segurança pública no exercício do seu ofício, atualmente transformado em de alto risco pela caça declarada aos policiais civis, militares e agentes penitenciários, preocupados neste momento, em se defender e à sua família, ficando a defesa social em segundo plano, o que é uma vergonha digna de renúncia, a todos os que se dizem responsáveis pela segurança pública. Entretanto, para renunciar é preciso primeiro reconhecer o erro, e para isso é necessário grandeza de espírito, desprendimento pela pompa que o poder oferece, humildade que só os grandes homens possuem, além de honra, atributos escassos entre os cargos comissionados das secretarias de segurança públicas por este país afora, vergonha para a poderosa sexta economia mundial, futura sede de eventos que nos projetaram para o planeta inteiro, quem sabe como um país onde o Estado é afrontado pelos que estão presos, e esta afronta é efetivada com a matança da ordem , pois, a cada policial morto, a sociedade morre e se desorganiza um pouco mais, visto que, são os policiais as colunas do edifício social.


Consequentemente, quando tomba uma coluna, mais instável fica a estrutura, já ameaçada de ruir e de soterrar a todos nós, povo, policiais, políticos e até mesmo os marginais, que estão se notabilizando pela utilização de uma das mais antigas táticas de guerra, a guerrilha, onde os inimigos são caçados uma a um, de forma isolada, covarde, e na maioria das vezes, na hora de descanso das batalhas ou ainda no chamado bico, trabalho extra e particular realizado pelos policiais honestos na sua hora de folga, em razão dos baixos salários pagos, como forma de complementar a renda, tornando-se desta forma, alvos fáceis, onde o fator surpresa está com os criminosos.


Neste quadro, torna-se incompreensível que algumas autoridades ainda neguem a existência do PCC, e outras defendam a tese de que ele está circunscrito ao estado de São Paulo, não oferecendo perigo ao restante do país. Esta visão é no mínimo míope, para não dizer mal intencionada ou pelo menos incompetente. Talvez pelo fato de que reconhecer a existência do crime organizado, é admitir a desorganização do Estado no setor de segurança pública, todavia, indo além das demagogias, a realidade é que São Paulo vive hoje um estado de guerra declarada entre policiais e bandidos, podendo se espalhar por todo o país, pois, com exceção do Rio de Janeiro, que possui suas próprias facções criminosas, como CV (Comando vermelho) e ADA (amigo dos amigos), os demais estados da federação, estão sob a influência direta do PCC.


É preciso urgentemente, uma reforma em nossas leis penais, e o momento oportuno é agora, quando se ensaia uma mudança do código penal brasileiro, sob a tutela da comissão dos notáveis, que se espera possam “notar o que está acontecendo em São Paulo, propondo punições mais severas para aqueles que atentem contra a vida de servidores, não só da área de segurança, mas também, outros servidores públicos de qualquer esfera de poder, além de penalizar todas as ações perpetradas contra instituições públicas, com sanções a altura de tal ato de afronta à ordem estabelecida, como já acontece em outros países, a exemplo dos EUA, onde alguns Estados punem com reclusão por tempo perpétuo e até com a morte, conforme o caso, aqueles que ousam tirar a vida de um policial, entretanto, como no Brasil não é permitida a pena de morte, exceto em caso de guerra declarada e nem a de prisão perpétua, por cláusulas pétreas, pelo menos se deve aumentar o limite das segregações sociais, superando o teto de 30 anos máximo de reclusão, atualmente instaurado em nossa execução penal, estipulando-se assim, penas elevadas para quem mata policiais, obrigando-os a cumprir no mínimo 2/5 do tempo de prisão em regime integralmente fechado, sendo réu primário e 3/5 em caso de reincidência, nos moldes dos crimes hediondos, em presídios federais de segurança máxima, sob a égide do RDD (regime disciplinar diferenciado), onde existe um controle maior sobre os detentos e suas atividades, além de incluir tal crime no rol dos crimes hediondos. Não é possível mais, encarar a barbárie que está sendo cometida contra os policiais como crime comum pela sociedade, e como ato meritório para o criminoso, que passa a usufruir de status e prestígio dentro das facções criminosas, muito mais atuantes que o próprio estado, já que, possuem inclusive, Estatuto de funcionamento com regras e sanções claras, mais convincentes que todo o nosso ordenamento jurídico. Neste sentido, contam com o medo como fator de persuasão, contra os que não se adequam aos planos traçados pelos seus líderes, e esse medo originário do receio de perder a vida, como resposta ao descumprimento das ordens emanadas, está agora sendo implantada pela força da violência aos policiais, e a toda a sociedade, contudo, é certo que os defensores da ordem não vão se curvar a essa situação absurda, revertendo com certeza o atual cenário, não pela competência das autoridades, todavia, pela honra inerente a todos os que abraçaram esta profissão, que se faz sacerdócio neste país, pois são os policiais, o baluarte da ordem e o bastião em primeiro plano de nossas liberdades e garantias individuais, ainda que o custo deste restabelecimento seja a sua própria vida. Com efeito, a matança da ordem não se efetivará enquanto houver policiais dispostos a defender a paz social e a soberania interna de nosso povo.


Como cognição final, cabe lembrar, a não atuação das Comissões de Diretos Humanos e das Ong´s de defesa da paz, neste episódio de matança da ordem, já que, tanto labutam em prol da defesa dos direitos ditos humanos, do qual parece não serem os policiais dignos, em uma verdadeira balança de dois pesos e duas medidas, dando a entender serem os mesmos alienígenas ou na melhor das hipóteses, substrato da raça humana ou humanos de segunda categoria, sem necessidade de proteção, como se não fossem pais, filhos, maridos, esposas, irmãos, enfim, seres portadores de vínculos familiares e afetivos tão importantes e intensos, quanto de qualquer outro ser humano componente da sociedade brasileira. É imperiosa a defesa das instituições policiais e de seus componentes, que como se já não bastasse os salários de fome pago ao longo dos anos por governos irresponsáveis e corruptos, que intencionalmente estabelecem políticas de desmonte da máquina pública de segurança, com a nítida opção de submeter os policiais a caprichos e interesses estranhos ao bem comum, minando pouco a pouco, o senso de justiça e a vontade de combater o mal, virtudes naturais de esmagadora parte dos membros da segurança pública em sua base, o que não é tão natural em sua cúpula, onde prevalece a política mesquinha de barganhas.


Em outro plano, a sociedade brasileira não pode exigir mais do que a vida dos policiais, pois, além dela, eles não possuem mais nada para dar, bastando a vida regrada da maior parte dos mesmos, resultado de políticas salariais inconsistentes com a posição de sexta economia mundial, atualmente ocupada pelo Brasil, que os submete os honestos, a necessidades incompatíveis com o serviço árduo de proteger a sociedade, não cabe mais aos cidadãos exigir que morram em prol da paz coletiva, devem sim, exigir da classe política desta nação e das autoridades de segurança pública, respeito para com aqueles que derramaram tanto sangue pelo próximo, e que em troca recebem tão pouco como reconhecimento. Nesta linha de raciocínio, podemos afirmar que o povo que não reconhece o valor de seus policiais, está fadado ao fracasso enquanto comunidade constituída, com efeito, não entender o maior dos sacrifícios humanos, como doação incondicional, é a mais contundente prova de uma frieza social doentia, que gela os corações, atrofia o pensamento, embrutece a alma e estagna moralmente as sociedades, levando-as ao ponto de implosão e posterior desintegração, como já aconteceu tantas vezes ao longo da história humana.




“Para que o mal triunfe, basta que os bons não façam nada.” 
(Edmund Burke)



Olivardo é investigador de polícia.


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